Brasil. Guilherme Boulos: “O bolonarismo continua sendo uma máquina formidável”

William Boulos Porta-voz do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL)

Como você analisa o ciclo político em que o Brasil se encontra atualmente? Qual a diferença entre a situação e a que prevalecia em 2018, quando o Bolsonaro assumiu o poder?

Guilherme Boulos Em 2018, Jair Bolsonaro venceu a eleição presidencial por meio de um forte sentimento antipolítico. Além disso, esta é uma alavanca comum a todas as experiências de extrema direita no mundo. Ele se passava por quem iria acabar com a corrupção, se apresentava como alguém que vinha de fora da arena política – o que estava absolutamente errado, claro! Mas esta é a imagem pública que ele vendeu. O descontentamento naquela época era muito grande. É nesse clima de rejeição à política que grande parte da população se alia a esta candidatura. Bolsonaro também afirmou tirar o país da crise econômica. Dois anos e meio depois, nada do que ele prometeu se cumpriu, muito pelo contrário. O Bolsonaro que jurou querer mudar o sistema, erradicar a corrupção, hoje se enreda, com seus filhos, sua família, seu círculo de parentes, em múltiplos escândalos. A base parlamentar em que se baseia se resume aos setores historicamente mais corruptos da política brasileira. Quanto à crise econômica, ela nunca acaba: a taxa de desemprego bate todos os recordes; O Brasil está de volta ao mapa da fome mundial, com, em 2020, 117 milhões de pessoas, ou metade das famílias, afetadas por dificuldades alimentares e 19 milhões de pessoas, ou 9% da população, enfrentando insegurança alimentar grave. É um cenário trágico, que se torna ainda mais apavorante com a pandemia, em que o Bolsonaro adota uma postura criminosa – não há outra palavra. Ele intencionalmente colocou obstáculos no caminho das medidas de proteção à saúde, confinamento, distanciamento social e, em seguida, a vacinação da população. Ele informou mal os brasileiros sobre a Covid-19. Isso nos levou a níveis dramáticos de contaminação, com números assustadores de mortes. Em breve ultrapassaremos a marca de 500.000 mortos. Tudo isso cria um clima totalmente diferente. E, nesse contexto, a recuperação dos direitos políticos de Lula coloca o Bolsonaro em uma situação defensiva. O Brasil de hoje não é o de 2018.

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Você está percorrendo os subúrbios de São Paulo. Isso é um aquecimento antes da campanha presidencial do próximo ano?

Guilherme Boulos Concorri às eleições municipais no ano passado em São Paulo, a maior cidade da América Latina. Chegamos ao segundo turno, com, ao final da votação, uma pontuação importante: 40,66%, e mais de 2 milhões de votos. Se eu me invisto hoje na periferia, não é por motivos eleitorais. Há vinte anos, na periferia, participo de movimentos, de lutas por moradia, por direitos sociais. Estou continuando este trabalho. Não tenho a pretensão de ser candidato à presidência do Brasil no ano que vem. Defendo a unidade da esquerda neste país: o nosso principal desafio, em 2022, será infligir uma derrota ao Bolsonaro. Ninguém pode fazer isso isoladamente. Nenhuma força política ou social pode enfrentar esse desafio sozinha: o bolonarismo continua sendo uma máquina formidável, com uma base sólida de apoiadores. Por isso, tento ajudar a construir uma unidade de esquerda, ao mesmo tempo que atuo no centro da mobilização da sociedade. Não podemos apenas esperar as eleições de 2022 e não fazer nada. Para o país, é um custo muito alto, do ponto de vista social, em termos de vidas humanas. Devemos, portanto, antes de nos projetarmos nesses prazos, enfrentar os desafios imediatos do momento. Na periferia de São Paulo e em todo o país, por exemplo, estamos desenvolvendo cozinhas solidárias para enfrentar a fome. É uma iniciativa popular, sem apoio do Estado, que cria laços de solidariedade em comunidades em situação de insegurança alimentar. Também estamos participando da luta pela vacinação em massa, que é um tema central do calvário que vivemos. E estamos lutando, ao mesmo tempo, para exigir a demissão do Bolsonaro.

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Todos os processos de impeachment estão agora bloqueados pela Câmara dos Deputados …

Guilherme Boulos Bolsonaro pagou pelo apoio que hoje tem no Parlamento. Ele comprou consciências. Isso é o que complica os procedimentos de impeachment hoje. A outra dificuldade é a mobilização, a seu lado, de milícias. Bolsonaro está diretamente ligado às milícias, setores insubordinados da polícia e certos setores das forças armadas. Ele está de fato organizando seu próprio exército político. É um cenário desastroso para o país, mas é possível dispensá-lo, porque sua popularidade está no nível mais baixo: apenas 25% dos brasileiros agora confiam nele, por causa de sua responsabilidade direta no agravamento das crises. econômica e sanitária. Encontramos um clima de forte mobilização social. Centenas de milhares de pessoas foram às ruas em 29 de maio, e novos protestos estão programados para 19 de junho em todo o país. É neste contexto de volta do protesto que se afirma a articulação do bolonarismo com os protagonistas armados, com o objetivo de criar uma situação de instabilidade democrática. Não apenas em um cenário de impeachment, mas também no próprio processo eleitoral.

Você teme o cenário de um golpe?

Guilherme Boulos Não é impossível no Brasil de hoje. Todos os dias, Bolsonaro repete que há “Um problema de fraude”. As eleições vão ocorrer no ano que vem, mas ele já grita fraude! Ele sabe que será difícil sair vitorioso em uma eleição limpa. Ele, portanto, já está trabalhando para mobilizar seus apoiadores, alguns dos quais estão armados, para atribuir uma possível derrota à suposta manipulação da futura votação e, assim, instalar a perspectiva de uma iniciativa golpista. Daí a importância da mobilização da sociedade brasileira e da atenção internacional para inibir os setores que poderiam se enquadrar em tal cenário.

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Para obter a maioria, o sistema eleitoral brasileiro obrigou o PT a se aliar a setores de centro e de direita por trás do golpe institucional contra Dilma Rousseff. Que estratégia você defende?

Guilherme Boulos Esses mesmos setores, que participaram do governo do PT antes de trair Dilma, estão hoje, em grande parte, na base parlamentar do Bolsonaro. Esse é o problema de um sistema de governo que tem muitas falhas. Defendemos a opção de uma reforma política profunda: devemos reduzir o peso desses lobbies, porque são na realidade lobbies corporativos, econômicos, sem identidade política, que introduzem interesses privados no Congresso e tomam parte. a todos os governos para ocuparem o máximo de espaço possível no seio do estado. Essa reforma terá que inventar novas formas de participação popular. O segundo imperativo é a reformulação das regras de financiamento das campanhas eleitorais, que, até agora, têm deixado um lugar desproporcional para banqueiros, empresários e agronegócios. Este sistema de financiamento da vida política confirma o domínio dos lobbies no Congresso. O governo do PT não o desmantelou. Em um novo ciclo progressista no Brasil, a esquerda terá que enfrentar esses problemas de frente.

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