CARTA DE SÃO PAULO
Existem apenas onze no planeta e cada um deles é um tesouro inestimável. Os casacos Tupinambá, todos feitos de penas brilhantes, são considerados um dos artefatos mais preciosos já produzidos pelos povos indígenas das Américas. Gesto inédito: em 2024, um deles deverá deixar o acervo do Museu Nacional da Dinamarca para cruzar o Atlântico e ser devolvido ao Brasil.
Com um metro e vinte de altura, tecida com fibras naturais e coberta com vários milhares de penas vermelhas de íbis, esta verdadeira joia em tom rubi está particularmente bem preservada. “Nenhum mineral, nenhum fóssil, nenhum artefato no mundo pode rivalizar com este manto. É simplesmente a mais importante peça etnográfica brasileira preservada no exterior! »entusiasma-se com emoção Alexander Kellner, paleontólogo e diretor do Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde agora estará exposto o precioso ornamento.
Usados durante rituais tradicionais e sagrados, os casacos Tupinambá há muito inflamam a imaginação europeia. Comprados, trocados ou simplesmente roubados dos nativos, eram moda nas cortes reais, representados em gravuras, telas, tapeçarias e afrescos, como o do teto do Salão d'Apollon do Castelo de Versalhes, pintado por Carlos de la Fosse. no dia 17e século. Apenas onze desses frágeis ornamentos sobreviveram oficialmente… mas nenhum está em exibição no Brasil.
O “casaco de Copenhague” estava presente na Dinamarca desde 1689. “Para nós, a sua restituição é um processo doloroso e emocionante.testemunha Christian Sune Pedersen, pesquisador e diretor de coleções do Museu Nacional. Doloroso, porque este casaco era caro aos corações dos dinamarqueses; e emocionante, porque entendemos sua imensa importância para os povos indígenas no Brasil. Temos certeza de que tomamos a decisão certa! »
“Não são meras obras de arte”
Negociada há anos por diplomatas brasileiros, a restituição deve muito à mobilização dos Tupinambá e, em particular, dos presentes no entorno da cidade de Olivença, no sul da Bahia. Exterminados pelos colonos portugueses, estes últimos lutam há duas décadas pela aprovação e reconhecimento pelo Estado dos seus direitos às suas terras tradicionais, ou seja, 47 mil hectares (4,5 vezes Paris) onde vivem 4.600 habitantes, ao longo da costa atlântica.
Para os Tupinambá, a busca pela terra e a busca pelo casaco andavam de mãos dadas. O impulso foi dado por uma personalidade colorida, Glicéria Tupinamba, 41 anos e natural da região de Olivença. Esta artista, activista e investigadora comprometeu-se a retomar a tecelagem de vestimentas rituais. Desde 2006, já conseguiu realizar três, uma das quais esteve exposta durante vários meses este ano na Casa do Povo (“Casa do Povo”), importante instituição cultural de São Paulo, em parceria com o Museu de Arte Contemporânea (MAC USP).
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