O primeiro contato de um expatriado com a cultura local geralmente passa pela descoberta da burocracia. Porque se a burocracia é universal, ela conhece suas especificidades de formas, práticas e intensidade de acordo com cada país.
Funcionários expatriados de grandes empresas multinacionais podem contar com suas organizações para fugir dos caminhos burocráticos obrigatórios. No Brasil, passamos por um despachante, um intermediário administrativo cujo trabalho é. Dá curto-circuito, simplifica tudo, resolve tudo. Ele encurrala o expatriado nos poucos passos onde sua presença física é imperativamente exigida. Prática ! Eu me beneficiei disso há alguns anos em Curitiba: resolvemos tudo em um mês.
Carteira de motorista em Curitiba
No Brasil, alguns circuitos são mais complicados, como a carteira de motorista. Tem que passar pelo Detran, órgão público regional de responsabilidade dele, com os “cartões cinzas” locais e o controle técnico. É uma grande organização com muita gente, notória pelo seu clientelismo e pela sua corrupção. Uma organização muito burocrática também!
Lembro-me de ter que usar truques para não ter que trocar minha licença francesa (com validade ilimitada) por uma licença brasileira do Paraná (com validade limitada). Mas de repente eu tive que passar por todo um procedimento, incluindo um exame importante. Assim, encontro-me numa sala com cem pessoas, de todos os níveis sociais e culturais, para uma longa prova que combina psicologia, língua portuguesa e código da estrada! Só estou sendo poupado do teste de direção. Eu considerei uma grande experiência democrática…até que meus amigos brasileiros me explicaram que em geral os brasileiros que têm dinheiro se contentam em comprar sua licença sem passar em nenhum exame!
Carteira de motorista no Rio
Dez anos depois, me instalando no Rio, cuido da transferência da minha carteira de motorista do Paraná para o Rio, e desta vez tenho que me virar sozinho, sem despachante. O atendente do Detran primeiro me explica que é muito complicado e que eu deveria tirar minha habilitação desde o início aqui no Rio. Consigo convencê-lo do contrário, mas há um novo empecilho: tirei minha habilitação curitibana como francês e estou pedindo sua transferência para o Rio como brasileiro. Não previsto no regulamento! Bloqueio. Felizmente, durante uma das minhas consultas, este atendente está ausente. Sua substituta, uma jovem encantadora, faz questão de resolver o problema imediatamente: “Não se mexa! Vou ligar para Brasília!” De fato, dez minutos depois, tudo está resolvido.
Regras de ouro com a burocracia brasileira: nunca desista, sobretudo nunca se zangue, pratique a gentileza com intensidade e, claro, conte com o sistema D, o famoso jeitinho Brasileiro. Uma constante: sempre acaba dando certo… mas pode levar tempo!
Eu tenho que renovar minha carteira de motorista a cada três anos. Acabei de fazer de novo. Descobri uma nova característica da burocracia brasileira: uma coabitação surpreendente entre práticas antigas, dignas do Terceiro Mundo, e modernização de ponta pela digitalização. Assim, você pode passar horas em uma fila desorganizada em instalações precárias e também obter um documento on-line instantaneamente em casa!
charme francês
Também tenho meu lance com o pessoal do Detran: uso o “charme francês”! O inspetor que me fez passar (mais uma vez) o código no Rio estava voltando de uma viagem à França: só conversamos sobre isso! E recentemente a médica que me fez o check-up (obrigatório aqui) ficou encantada por poder praticar seu francês comigo. É uma burocracia com rosto humano.