(Rio de Janeiro) O Brasil no sábado se tornou o segundo país do mundo depois dos Estados Unidos a ultrapassar o limite de 500.000 mortes por COVID-19, com um recente aumento nas mortes diárias confirmando a iminência de uma terceira onda.
O último relatório do Ministério da Saúde, subestimado segundo vários epidemiologistas, informa 500.800 mortes, incluindo 2.301 registradas nas últimas 24 horas.
Nesta semana, a média semanal de mortes diárias subiu para mais de 2.000 pela primeira vez desde 10 de maio.
O país de 212 milhões de habitantes também registrou 82.288 novas infecções só no sábado, elevando o total para 17.883.750.
“A terceira onda está acontecendo, mas a vacinação, que pode fazer a diferença, ainda é muito lenta e as autoridades parecem não querer tomar novas medidas restritivas”, explica à AFP Ethel Maciel, epidemiologista da Universidade do Espírito Santo (Ufes).
Nas grandes cidades do país, a vida parece estar quase de volta ao normal, com restaurantes, bares e lojas abertos e grande número de pessoas desmascaradas nas ruas.
A situação, porém, é crítica em 19 dos 27 estados brasileiros, com mais de 80% de ocupação em leitos de terapia intensiva e 90% em oito deles.
«Maratona»
A segunda onda – de janeiro a abril passado – foi particularmente letal, o número de mortes tendo aumentado exponencialmente com a circulação da variante Gama, que surgiu em Manaus, na Amazônia (norte).
O número de mortes diárias começou a diminuir ligeiramente a partir de maio, graças ao fechamento de lojas, especialmente durante as semanas mais críticas.
Mas os epidemiologistas acreditam que a reabertura ocorreu muito cedo, enquanto o número de mortes se estabilizou em um patamar ainda elevado: cerca de 2.000 por dia.
Ao contrário do que se tem observado na Europa, não houve uma verdadeira calmaria entre as ondas no Brasil.
“Temos a impressão de que nunca realmente saímos da primeira onda. Parece que a pandemia no Brasil se comporta como um maratonista e não como um velocista que acelera repentinamente e perde velocidade logo em seguida ”, disse Alexandre da Silva, especialista em saúde pública e médico da Universidade de São Paulo (USP).
Várias grandes entregas de vacinas chegaram recentemente ao Brasil, em particular a da Pfizer, e algumas cidades puderam assim dar um impulso às suas campanhas de imunização, em particular Rio e São Paulo, as mais populosas do país.
Mas apenas 29% da população recebeu pelo menos uma dose e 11,36% está totalmente vacinada.
A campanha de vacinação começou tarde, em meados de janeiro, com as vacinas da AstraZeneca e da chinesa Coronavac.
O presidente de extrema direita Jair Bolsonaro, tão crítico com as vacinas, prometeu imunizar toda a população até o final do ano, meta difícil de ser alcançada segundo especialistas.
Copa América em meio a uma pandemia
É nesse contexto mais preocupante que o Brasil sedia desde o último domingo a Copa América de futebol, que reúne estrelas mundiais como Neymar, Messi e Suarez.
As partidas acontecem a portas fechadas, mas Jair Bolsonaro tem sido amplamente criticado por receber o torneio de braços abertos em meio a uma pandemia, após as retiradas da Colômbia e da Argentina.
As manifestações de Antibolsonaro aconteceram neste sábado em várias cidades do Brasil aos gritos dos slogans “Dehors Bolsonaro”, “Governo da fome e do desemprego”, “Vacina agora” ou “Vacina no braço e comida no prato”.
A “postura” “de Bolsonaro na COVID-19 e sua negação é absurda. Já está fora da realidade, fora do senso comum, não dá para explicar, é tão surreal”, disse Robert Almeida, fotógrafo de 50 anos que participou da manifestação no Rio de Janeiro.
“Poderíamos ter evitado milhares de mortes se a gestão da crise sanitária tivesse sido diferente, com real coordenação nacional”, lamenta a epidemiologista Ethel Maciel, que denuncia uma “batalha ideológica” alimentada pelo discurso anticonceramento do presidente Bolsonaro.
Este último provocou alvoroço na semana passada ao anunciar que iria pedir ao Ministério da Saúde que revogasse a obrigação de usar máscara ao ar livre.
O presidente também foi multado várias vezes por participar de manifestações com o rosto descoberto.
Uma comissão de inquérito do Senado potencialmente explosiva busca há um mês e meio a gestão caótica da crise de saúde.