Nas telas quarta-feira, 6 de dezembro, o primeiro longa-metragem da diretora brasileira Lillah Halla, Levante, selecionado para a Semana da Crítica do Festival de Cannes 2023 e premiado no Festival de Cinema Latino-Americano de Biarritz. Cheio de cor e música, conta com um time de vôlei, unido em torno de Sofia, sua capitã, que luta contra o conservadorismo da sociedade brasileira.
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Esta equipe de vôlei é “inclusiva”, podemos ler no cartaz afixado no escritório de Sol, treinadora do grupo, a curvilínea figura materna da atriz Grace Passô. Um time queer, cheio de vida e risos, liderado por sua capitã Sofia, de 17 anos, a quem a federação promete uma possível ida ao Chile com uma bolsa para se tornar jogadora profissional de vôlei. Um esporte muito popular no Brasil.
O sonho fica preso num osso: Sofia descobre que está grávida num país, o Brasil de Bolsonaro, onde o aborto é proibido. Com o apoio do amante e dos amigos, depois do pai e da treinadora Sol que acabará conquistada para a sua causa, Sofia tenta encontrar uma solução para se livrar do feto, a ponto de, sem saber, recorrer a um instituição religiosa que tornará sua vida muito difícil. Telas pretas e trilha sonora abafada testemunham suas dúvidas e ansiedades.
Os atores que interpretam Sofia, Ayomi Domenica – às vezes ensolarados, às vezes frágeis – e aqueles próximos a ela são muito justos. Neste filme colorido e muito físico, os corpos se movem, festejam e amam. Eles preenchem a tela, a câmera gruda na pele. Nos chuveiros, os jogadores brincam e dançam nus para comemorar a vitória, com perfeita naturalidade. “ Eu não dou um roteiro aos meus atores », afirma o realizador que deixa muito espaço para a improvisação. A maioria dos atores aqui não são profissionais.
A rainha da colmeia
Personagem masculino raro no filme, João, o pai, é interpretado por Romulo Braga, um ator experiente que descobrimos no ano passado no filme Carvão de Carolina Markowicz no festival de San Sebastian. João é apicultor. Nós o vemos ocupado com suas colméias, explicando como corta as asas da rainha para que ela não escape. Se Sofia é como a rainha da colmeia, com os seus trabalhadores solidários que inventam mil receitas para a tirar da armadilha e arranjar dinheiro para abortar, João é o pai adoptivo que produz o mel que escorre como seiva e cujo ouro a cor é a da pele dos personagens do filme. João, que incentiva a filha a tentar a sorte, e dá-lhe um magnífico par de sapatos vermelhos (uma homenagem ao filme Os chinelos vermelhos de Michael Powell?) para dançar nas pistas chilenas.
Os “bandidos” do filme são os cristãos fundamentalistas que perseguem Sofia e seu pai e aproveitam seus relacionamentos para isolá-la. Crentes sectários como aqueles que se espalharam durante o mandato de Jair Bolsonaro, infiltrando-se em todas as engrenagens da sociedade.
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E são todos brancos… Mas contra eles, o coletivo em torno da jovem se mantém unido. O coletivo assume o problema íntimo da jovem. O coletivo, o da colméia e o do time de vôlei, dá forças para seguir em frente, tentar vencer o campeonato e se reerguer diante das adversidades como sugere o título do filme. Levante o que significa muitas coisas, explica a diretora, para quem este é seu primeiro longa-metragem. Formada pela Escola Internacional de Cinema de Havana (EICTV), já havia dirigido um notável curta-metragem, Menarca, premiado no Cinélatino de Toulouse em 2021. Levante« é também uma palavra politicamente carregada que significa revolta. Em brasileiro, também se refere a uma planta que usamos para ritos mágicos que supostamente nos dão poderes. » Está em curso uma insurreição?