Brasil. Três lições da mobilização “Fora Bolsonaro” de 3 de julho – Contra

Valeria Arcary

O dia da mobilização nacional de 3 de julho – Fora Bolsonaro – foi uma vitória. Seguem três lições.

A primeira é que a força da Frente Unida de Esquerda pode manter forte pressão das ruas pelo impeachment. A queda de Bolsonaro não é para amanhã, mas aparece como uma possibilidade no horizonte. Não é iminente. Ainda estamos na escala de algumas dezenas de milhares nas grandes cidades. A derrubada do governo de extrema direita exigiria a presença de uma massa popular de vários milhões.

Este será um processo contínuo que exigirá determinação. Ele precisa ser construído, mas é uma perspectiva muito mais eficaz em comparação com a tática quietista de desgaste lento até as eleições de 2022. Seria um erro oportunista imperdoável perder esta oportunidade.

A segunda é que é possível dividir, dividir e violar os partidos da classe dominante. Essa dinâmica ainda é inicial, nascente, embrionária, mas está em vigor e não deve ser desperdiçada. Não podemos lutar, ao mesmo tempo e com a mesma intensidade, contra todos os inimigos. A unidade nesta ação com os partidos que são historicamente a representação da burguesia é decisiva. Um setor dos grandes capitalistas já se encontra em posição de oposição. Mas as principais fileiras da burguesia ainda apóiam Bolsonaro. Portanto, a preocupação e a insegurança prevalecem sobre a abordagem de um processo de impeachment. Esta seria a segunda pausa em um mandato presidencial em cinco anos [après celle ayant frappé Dilma Rousseff en 2016]. Uma hesitação que revela a instabilidade do regime para conter os excessos de um governo de extrema direita.

O impacto de mover grandes setores da classe média para apoiar o impeachment seria uma vitória espetacular e promoveria sobremaneira uma possível mudança no equilíbrio de forças políticas dentro do Congresso Nacional. O apoio dos líderes da direita liberal para a remoção de Bolsonaro é progressivo. Seria um erro sectário imperdoável ignorar a importância desta unidade específica de ação.

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A terceira é que duas ações realizadas por grupos minúsculos, infelizmente, potencializaram repercussões perigosas em São Paulo. Um foram os ataques gratuitos e perturbadores de membros do PCO (Parti da Causa Operária) contra ativistas LGBT do PSDB que se manifestaram em unidade de ação. Não foi de forma alguma um ato de autodefesa em face de um ataque de fascistas. Ativistas LGBT do PSDB estiveram legitimamente presentes para apoiar o programa Fora Bolsonaro.

A outra consistia em provocações aos deputados no final da procissão – como já havia acontecido no dia 19 de junho – por anarquistas a favor das chamadas táticas de black bloc. Esses dois incidentes são amplamente utilizados nas redes sociais pela extrema direita para denunciar, desqualificar e desmoralizar as mobilizações a favor do impeachment. Seria um erro “ultra-esquerdista” imperdoável não garantir um certo nível de segurança a este respeito nas próximas mobilizações unitárias.

As mobilizações em mais de trezentas cidades – e inclusive em muitas cidades ao redor do mundo – confirmam que a campanha do Fora Bolsonaro continua, estimulando um processo de acumulação de forças. Em Porto Alegre e Fortaleza, por exemplo, o dia 3 de julho foi mais importante do que os dias 29 de maio e 19 de junho. Nas demais capitais, a situação foi semelhante. Em outros ainda, as mobilizações foram um pouco menores, mas ainda importantes. Não houve salto qualitativo. Mas as acusações de “prevaricação” [à propos de l’achat de vaccins indiens] o direcionamento ao Bolsonaro levou à abertura de inquérito por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

A convocação urgente para o dia nacional de protestos em 3 de julho foi uma decisão clara e corajosa. A foto foi tirada no sábado, 26 de junho, um dia após a denúncia do crime de Bolsonaro pela compra da vacina da covaxina, e os riscos não eram pequenos. Apenas quinze dias após o dia 19 de junho, e ainda nas condições muito perigosas da pandemia, o comitê do Fora Bolsonaro foi unânime. A unidade da Frente de Esquerda foi preservada. Nos sete dias seguintes, as cisões políticas dentro dos partidos de direita aumentaram e o apoio aos protestos aumentou, com a ascensão de ex-líderes da direita bolonarista e da direita liberal.

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A grande petição unificada de impeachment [imputant à Bolsonaro 23 crimes au regard de la loi 1.079/50 connue comme loi de l’impeachment, pétition signée par 45 élu·e·s] também foi uma jogada inteligente. Apresentado conjuntamente por todos os partidos de esquerda com raízes operárias e referência ao socialismo – portanto situados no mesmo campo classista – mas também por dissidentes do bolonarismo, como Joice Hasselmann [journaliste et femme politique membre du Parti social-libéral élue avec un nombre très important de voix] e o MBL (Movimento Brasil Livre, criado em 2014, claramente situado na direita liberal), foi um gesto firme e maduro.

Essa tática parlamentar pode florescer. Tranquiliza e contribui para elevar o ânimo de um setor militante de esquerda preocupado, atormentado, angustiado com a gravidade do desastre sanitário e social e com a lentidão do desfecho da crise. Todos nós sabemos que o Bolsonaro não vai cair em desgraça e que sempre existe o perigo “ao virar da esquina”. Mas o mais importante é que neste sábado, 3 de julho de 2021, se aproxima o horizonte da destituição de Bolsonaro.

Não é verdade que Bolsonaro seja o inimigo ideal para um segundo turno em 2022. Não é verdade que o maior perigo para a estratégia de um governo de esquerda seria uma candidatura de uma chamada ala esquerda da direita liberal. Não é verdade que o impeachment interessa aos propagadores de uma candidatura de direita disfarçada de candidatura de centro. Não é verdade que lutar pelo impeachment agora, com todas as forças, é construir uma escada curta para que o PSDB (Partido da Social-Democracia Brasileira) volte à presidência.

O bolonarismo não é uma corrente eleitoral, é o neofascismo. Ele está se preparando para enfrentá-lo e não hesitará em precipitar um ataque frontal às liberdades democráticas quando se sentir encurralado antes de 2022. Bolsonaro está enfraquecendo, mas não é um cadáver político insepulto. Ele pode se recuperar. Em algum momento, veremos uma sensação de alívio à medida que as consequências da pandemia diminuírem. A recuperação econômica já está em andamento, embora lenta.

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A derrota do governo Bolsonaro só é possível se a corrente neofascista que o sustenta estiver contida, isolada, reprimida e desmoralizada. Há um partido neo-fascista militante em formação, como uma força de choque a serviço de um projeto de auto-golpe [autogolpe]. Seus membros são inflexíveis, sectários, raivosos, enfurecidos e, portanto, incontroláveis. Sua euforia segue um plano para espalhar o ódio e impor o medo. Eles estão se preparando para a luta pelo poder. Eles dependem de uma corrente de massa reacionária. Eles apenas respeitam a força.

Sua estratégia é destruir a esquerda. Tudo à esquerda. Ativistas de movimentos ambientalistas, feministas, negros, indígenas, LGBT, estudantis, populares e sindicais. Os partidos mais moderados e radicais. Eles não se deixarão intimidar pelas decisões do Congresso ou do STF (Supremo Tribunal Federal). Eles só podem ser derrotados por uma força de esquerda militante, motivada, combativa, determinada e inabalável.

Engana-se dramaticamente quem calcula que podemos escolher o terreno em que vamos medir nossas forças contra o bolonarismo e que devemos favorecer o terreno eleitoral. A luta política contra os neo-fascistas acontecerá em todas as áreas: instituições, eleições, mas será decidida por uma força de luta social que é mais poderosa no momento das mobilizações de massa. Esta mobilização contra os fascistas só poderá galvanizar as massas se, além da defesa das liberdades democráticas, incluir propostas que vão ao encontro das aspirações mais profundas. (Editorial publicado no site Deixou Online – Site atual do PSOL Resistencia – 4 de julho de 2021; tradução editorial Contra)

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